Apesar da cultura cafeeira estar em crescente fase de expansão em busca de terras agricultáveis ao oeste do Estado de São Paulo, no início do século XX, uma eficiência de conhecimento varria os órgãos oficiais com relação aos que denominavam de sertão paulista.

Entendendo por sertão todas as terras localizada à oeste das últimas habitações feitas por pioneiros em direção ao Estado do Mato Grosso, o povoamento do que já denominavam de interior se restringia à recém-formados patrimônios e cidades que serviam de entrepostos para a promoção do desbravamento das terras nativas em direção às barrancas do rio Paraná.


Abertura da mata para construção de edificações


Tendo estas cidades como referência, inúmeras expedições, sejam de caráter particular ou do Governo, foram organizadas para reconhecerem os principais cursos d´água do Estado e conseqüentemente verificar outros quesitos que constituíam o extremo Oeste. Foi a partir destes mecanismos de reconhecimento do território que o desbravamento em direção ao rio Paraná começou a ser acelerado.

Por volta de 1905, o Governo do Estado de São Paulo organizou quatro expedições que tinha por propósito reconhecer com maior detalhes os rios Paraná, Tietê, Feio e Peixe. Denominada de "Comissão Geographica e Geológica do Estado de São Paulo", esta organização estadual passou a constituir diferentes "Turmas" objetivando estudos mais completos dos respectivos rios.

Os conhecimentos geográficos do início do século em torno destes rios apontava que ao sul do principal que cortava o Estado de São Paulo, já na época denominado de Tietê, existia dois rios de expressividade. O mais próximo era chamado de Rio Feio devido seu trajeto sinuoso, altas matas que fechavam seu curso d´água em grande parte e dava uma sensação selvagem das mais intensas possíveis. O outro, localizado mais ao sul do primeiro, era denominado rio do Peixe, segundo os desbravadores "merecendo perfeitamente o nome que traz" diante da quantidade de exemplares como "dourados, piabas, pacus, piranhas, corumbatás, sucury, lambary, etc." em seu curso inicial. O que norteava o imaginário desses estudiosos da época era que o rio do Peixe, em seus quilômetros iniciais, por possuir uma largura menor e localizar-se num relevo propenso para o norte era um expressivo afluente do Rio Feio.

Em 10 de maio de 1905, partiu da capital paulista, a Comissão que iria efetivar a Expedição do Rio Feio. O conhecimento à respeito deste curso d´água restringia-se à ideia de que suas nascentes localizavam-se na Serra dos Agudos e, daí, partia para um sentido desconhecido, tendo em vista sua grande sinuosidade. Muitos cartógrafos da época, defendiam a hipótese de que o Rio Feio poderia desaguar no Rio Tietê ou no Rio Aguapeí, ambos já conhecidos como afluentes do Paraná. Ainda não era certa a idéia de que o rio Feio correspondia ao Aguapeí que desaguava no rio Paraná.

Sabia-se que o destino do rio era o Paraná, porém, as identificações eram deficientes diante da possibilidade destas águas chegarem no grande rio desaguando anteriormente em outros cursos. Com o decorrer da expedição em sentido que muitas vezes confundiam os expedicionários, tendo em vista as constantes curvas do Feio e as matas densas que o abrigava, o conhecimento da vegetação passou a ser a tônica dos estudiosos da Comissão.


Retirada de uma árvore na época do desbravamento da região


Diante da descida pelo rio Feio, a Expedição pode conferir num segundo momento que depois de receber as águas do então denominado "Rio Presidente Tibiriça (...), seu leito é acidentado por trinta e quadro corredeiras e escarpando por um salto de 16 metros, o salto ‘Dr. Carlos Botelho’".

Dividia-se então, grosso modo, o Rio Feio em duas partes. A alta, localizada acima do principal Salto deste trecho acidentado e, a baixa, após a referida cachoeira. Desta divisão, persistiu, após alguns estudos que comprovaram a unicidade do Feio e Aguapeí, a dupla denominação do curso d’ água. Assim, passara a ser chamado de Rio Feio a parte alta, enquanto, o Rio Aguapeí constitui-se na designação das águas abaixo do Salto Botelho.

A expedição do Rio do Peixe tinha como propósito confirmar o que muitos experientes desbravadores de cursos d´água já defendiam; a tese de que os Rios Peixe e Tigre era apenas um.

Tais prognósticos intensificaram-se, principalmente, após a confirmação de que o Feio e o Aguapeí tratava-se de um único rio e o deságüe do Peixe neste curso d´água não foi confirmado, tendo em vista apenas o encontro de afluentes pequenos.

A propagação das notícias de que a "Turma" anterior que realizara a Expedição do Rio Feio encontrara efetivos vestígios da presença de índios, causou um clima difícil de ser amenizado pelos líderes da "Comissão".

Muitos sertanejos, sabendo das dificuldades cotidianas do desbravamento diante do hostil trabalho em meio às matas, recusavam a participar em tipos de empreitadas como estas e, para complicar mais ainda a organização, estavam mais apavorados diante das repercussões que o ataque de silvícolas à Expedição anterior tinha proporcionado.

Desanimados com certos trechos de paupérrima situação natural, os expedicionários faziam questão de desmistificar a crença de que no sertão a fauna era constituída de grande abundância de peças de caça e pesca. Assim, passaram a defender a idéia de que a exuberância não poderia ser um item genérico de identificação do sertão paulista. Na realidade, existiam trechos que por apresentar excelentes índices de riqueza natural ofereciam para muitas pessoas da época uma riqueza indescritível das matas nativas do extremo oeste do Estado, porém, diante de estudos mais detalhados foi possível a expedição evidenciar as particularidades de cada parte que perfazia o curso d’água, dessa forma, descrevendo características mais apuradas do que realmente era o rio do Peixe. Assim, passaram a ver na parte de baixo do rio uma contraposição às nascentes, descrevendo margens com barrancos baixos, propensos à inundação e constituição de vegetação apática.


Vista parcial de Junqueirópolis no início do povoamento


Em contraposição às denominações de afluentes da parte alto do rio do Peixe, os desbravadores batizaram certos ribeirões demonstrando inúmeras dificuldades encontradas na exploração da parte baixa deste rio. Enquanto que nas nascentes a admiração preponderou mediante relatos encantados com a fauna e a flora, a exuberância da caça, a inexistência de ataques e encontros com os índios, abaixo do ribeirão da Confusão e, portanto, na segunda parte do rio do Peixe, os dados causaram desânimo para a "Comissão".

Abaixo do ribeirão da Confusão, "os índios permitiram que a Turma executasse os trabalhos sem interrupção até vencer a região das cachoeiras; aí os vestígios começaram aparecer mais freqüentemente, os trilhos eram vistos em grande quantidade, ora indicando a travessia do rio, ora margeando-os". Conforme a expedição descia o rio, muitos objetos eram vistos, como prova de que os indígenas deixavam seus lugares de forma rápida sem importarem-se com seus instrumentos. Flechas, arcos de caça, balaios, potes, pinças, cabaças com ervas, fibras de caraguatá, pilão, cestos com sementes de abóbora, pote de argila, rosários de crânios de macacos, tangas, eram exemplos de objetos encontrados pelos expedicionários em lugares que os silvícolas tinham deixado suas moradias às pressas.

Os Coroados, passaram a ser considerados "bravios" na medida em que o reconhecimento desta área foi efetivando-se, porém, os confrontos eram rápidos, preponderando a investida dos sertanejos em meio à alguns ferimentos diante das efêmeras retiradas dos índios que, em grande parte, sofriam com o processo de aculturação daqueles que invadiam suas terras.

Este contato hostil com índios que marcou a Expedição do rio do Peixe, contribuiu para denominações de afluentes localizados próximos aos atritos. Exemplos foram as designações "Ribeirão do Fogo" e "Ribeirão das Caingangs", ambos relacionados com o contato nada amigável com os Coroados.


Primeiras casas de Junqueirópolis


Tal processo de colonização trouxe conseqüências irretratáveis para a cultura indígena que habitava as terras. É justamente esta invasão do espaço silvícola que marcará o período de ocupação nas terras do Espigão Peixe-Aguapeí. Os nativos, na maioria dos casos, acabaram fugindo para lugares mais distantes ao perceberem as investidas dos sertanejos, enquanto que outra parte destes grupos étnicos sofreram transformações no modus vivendi, adequando-se às relações sociais dos colonizadores.

Em meio à este clima de disputa pela terra, diferentes pessoas passaram ocupá-las, originando a colonização ao norte e sul dos Ribeirões dos Caingangs, Fogo e Engazeiro. Sertanejos independentes e dispostos à conquistarem um pedaço de chão passaram a embrenhar-se em grandes glebas que continuamente sofriam impasses com relação aos verdadeiros donos. Num segundo plano, totalmente excluídos deste processo, os indígenas já não conduziam suas atividades nestes espaços conquistados. A dominação dos colonizadores e o desaparecimento paulatino de qualquer vestígio indígena constituíram a tônica das décadas de 20 e 30.

Tal colonização foi desenvolvida anteriormente com o reconhecimento por parte de expedicionários do Rio Santo Anastácio, promovendo a inserção nestas terras de conquistadores de extensas glebas.

Três grandes nomes influentes na conquista deste espaço preponderaram no sertão localizado ao sul do Peixe. Sabe-se que as extensões que iam desde Campos Novos até às margens do Paraná e do Paranapanema, estavam em posse de José Theodoro de Souza e seus genros João da Silva e Francisco de Paula Moraes.

Nestes anos, nas terras de Francisco de Paula, pouco existia de povoamento. Aquilo que estava sendo originado era resquício de acampamentos feitos por expedicionários que tinham o propósito de reconhecer a região, tais como as Vilas Goulart, Coroados e Tibiriçá. Além disso, a expansão da Estrada de Ferro Sorocabana, que no início do século estava localizada nas proximidades de Campos Novos, abria maiores possibilidades na formação de patrimônios localizados ao sul do Peixe. Nas nascentes do rio, partindo do maior dos povoados, Campos Novos, era possível chegar até o rio Paraná atravessando grandes extensões de matas que, no máximo, haviam sofrido a interferência do homem em lugares estritos com o objetivo da abertura de picadas, bem como, do avanço da ferrovia.

O caminho usado para chegar até o rio Paraná, margeando o rio Santo Anastácio, fez deste curso d’água um dos mais importantes na efetivação da colonização das terras localizadas ao sul do Peixe. O desbravamento deste espaço foi fator determinante na colonização, condicionando o avanço dos desbravadores para aquilo que correspondia, no imaginário das pessoas da época, a metade do espigão Peixe / Aguapeí. Dessa forma, o curso d’água passou a servir de referencial para projetos de ocupação de terras próximos ao rio do Peixe.

Com a chegada constante de desbravadores interessados em conquistar suas posses e outros movidos pelo crescimento do giro de capital que esta migração poderia causar, fundaram a vila de Santa Anastácio. A Companhia dos Fazendeiros Paulistas, tendo-se instalado em 1916 nas extensões que perfaziam esta grande ocupação de terras tinha como empreendedor Artur Ramos da Silva Júnior.

O progresso de Santo Anastácio, além de ser incentivado pela chegada de inúmeros desbravadores interessados em terras neste extremo oeste do Estado de São Paulo, também teve outro fator de desenvolvimento. A chegada da Estrada de Ferro Sorocabana em suas proximidades possibilitou um crescimento que ao efetivar a elevação à Distrito, colocou o vilarejo numa condição favorável com relação à outros núcleos que formavam-se nestas extensões. Dessa forma, de maneira efêmera, Anastácio em 1925 tornou-se município e após dois anos, em 1927, já elevou-se à categoria de Comarca, servindo inúmeros povoados que estavam em processo de colonização em suas proximidades.

Já em meados da segunda metade da década de 30, os primeiros municípios dentro do Espigão foram originados. Tupã, Lucélia e Canaã, foram exemplos de vilarejos que começaram a receber expressiva quantidade de colonizadores que promoveram um desenvolvimento da parte leste da região da Nova Alta Paulista.

Com o estabelecimento de inúmeros povoados, tanto nas regiões da Sorocabana e Noroeste, como também, na nova região que demonstrava muita riqueza para o plantio da cultura cafeeira, muitas rotas foram formadas na condução deste processo. A importância que estes caminhos possuíam para os colonizadores estavam na garantia do desbravamento, na expansão dos projetos e na própria sustentação econômica das novas terras. Diante das primeiras propriedades abertas próximas aos ribeirões do Fogo e Caingangs, duas rotas de desenvolvimento estabeleceram-se: uma mais antiga, proveniente do desenvolvimento da região da Sorocabana e outra, mais recente, que se estabeleceu com a própria frente de expansão leste-oeste da Alta Paulista.

A importância da estrada que ligava Santo Anastácio à Andradina, possibilitou a passagem de inúmeras pessoas por estas matas e, conseqüentemente, o afloramento de suas pretensões em assumirem extensões de terras que ainda estavam envolvidas em questões judiciais.


Vista aérea da cidade no início da década de 60


Sabe-se que, diante do povoado da União que se desenvolvia, os problemas de grilagem estavam sendo evidenciados ao extremo. Tancredo Ayelo e José Maria Figueiredo, colocavam-se como donos de grandes faixas de terras que sofriam constantes contraposições de pequenos agricultores interessados em ter suas posses. Além disso, as dificuldades de conhecimento da legitimidade das terras colocava muitos negócios numa condição duvidosa. Alguns empreiteiros assumiam a venda de propriedades que, com o tempo, passavam a ser contestadas por pessoas influentes que reivindicaram a posse de terra, alegando que determinadas propriedades encontravam-se inseridas em suas glebas detentoras de bases legais. A origem da designação do povoado proveio da "união" estabelecida entre pequenos proprietários interessados em manter suas posses, mesmo com as pressões estabelecidas por grandes grileiros.

A sustentação deste primeiro ciclo de colonização responsável pela formação do patrimônio da União devido à abertura da estrada que ligava as duas regiões que espremiam as terras do Espigão, esteve relacionada com o desenvolvimento da cidade de Santo Anastácio, pois a mesma, tinha participação direta nos problemas enfrentados pelos desbravadores nestas terras. Sabe-se que, todos os problemas de ordem legal eram solucionados na cidade. Além disso, quando o assunto era produtos que a tecnologia desenvolvida pelos colonizadores não permitia sua fabricação, era o comércio daquele município quem servia aos interessados em produtos mais específicos. No campo da saúde, por exemplo, os primeiros tratamentos de doente também eram realizados em dependências existentes em Santo Anastácio.

Porém, quando os problemas tornavam-se mais complexos, Presidente Prudente, cada vez mais, era visto como alternativa mais próxima, pois seu crescimento contribuía em muito para a resolução de problemas mais graves destes desbravadores.

Este avanço, propenso à conflitos de terras, foi expressivo na segunda metade da década de 30, onde já em 1937 era possível a existência de moradias de habitantes que dispuseram-se abrir matas, bem como, estabelecerem propriedades agrícolas para o sustento de suas famílias.

É na transição das décadas de 30 e 40, que a frente de expansão proveniente de Santo Anastácio perde a supremacia em torno do projeto de colonização por causa do aumento das fundações de patrimônios entre o Espigão Peixe-Aguapeí. O desenvolvimento da vila Lucélia é considerado fator primordial na formação de um segundo clico de colonização visto como impulsionador do desenvolvimento destas terras que passavam por uma frente de expansão sustentada pelo município anastaciano. Abria-se, dessa forma, inúmeras perspectivas com relação ao progresso mais efetivo das extensões do Espigão, tendo em vista as cogitações da elevação de Lucélia à município em meio à política de desenvolvimento promovida pelo Governo do Estado de São Paulo através da denominada Lei Qüinqüenal. Esta, rezava pela abertura periódica de pedidos de patrimônios para a legalização de suas elevações, seja à Distrito de Paz ou Município. O progresso luceliense era sentido por todos aqueles que estavam interessados em efetivarem o desbravamento de terras existentes entre os rios Aguapeí e Peixe. Dessa forma, os primeiros trabalhos com o propósito da emancipação daquele povoado estavam sendo realizados abrindo-se inúmeras perspectivas quanto ao progresso da região.

A Companhia Paulista de Estrada de Ferro realizava trabalhos para ampliar a linha até o povoado de Tupã, com prognósticos para finalizar as obras até o final do ano de 1941, Além disso, diante do direcionamento que a estrada tomava, as perspectivas em torno da chegada da mesma até as barrancas do rio Paraná eram grandes. Acaso estes rumores fossem concretizados, o desenvolvimento da região do Espigão seria efetivado sem sombras de dúvidas.

Os fortes boatos que a Estrada de Ferro se estenderia no sentido Oeste da região, permitiu um avanço de empreendedores independentes na conquista e compra de glebas, bem como, de Companhias Imobiliárias e de Colonização. Os negócios que norteavam inúmeras pessoas a investirem nestas terras eram grandes. Poucos eram aqueles que conseguiam extensões com o propósito de revender, tendo em vista a necessidade de relações políticas com autoridades estaduais. Neste caso, a legalização era peça fundamental para o bom andamentos dos negócios e a publicidade valorizando a eventual passagem por seus patrimônios também contribuía para boas vendas. Sabe-se que, a grande linha mestra que impulsionou inúmeros colonizadores a investirem na região foram as perspectivas de progresso depositadas em torno da chegada da Estrada de Ferro.

Dessa forma, muitos empreendedores apropriaram-se da idéia de que seus patrimônios em formação seriam servidos pela linha férrea e, portanto, compensava para os compradores de menores propriedades, sejam rurais ou urbanas, investirem nestas terras. Segundo dados coletados em municípios da região, é forte a presença de um imaginário na vida das pessoas que passavam a residir em patrimônios que estavam em processo de formação. A publicidade por parte daqueles que estavam à frente de projetos urbanos era grande em torno da eventual passagem dos trilhos. A maioria daqueles que planejaram e fundaram vilarejos em terras que compreendiam o espigão, objetivaram a formação de cidades prósperas colocando declaradamente em suas plantas urbanas a passagem da futura Estrada na intenção de efetuar as vendas pelo menos enquanto os trilhos não chegavam.


Rua Rui Barbosa, no início da década de 50


Dentre os interessados em promover tais empreendimentos, existia aqueles que apesar de possuir bom relacionamento com autoridades políticas da capital, pretendiam estabelecer moradia em terras consideradas como suas posses. Num plano mais inferior, chegavam aqueles para trabalharem como empregados e cheios de esperanças diante de uma eventual conquista de pedaço de chão. Assim, configurava-se duas frentes de expansões que delimitou a formação de alguns patrimônios.

Na primeira metade da década de 40, após averiguações num grande espaço localizado ao leste do povoado da União, Álvaro de Oliveira Junqueira, residente na capital do Estado de São Paulo, resolveu comprar terras. Sabia o comprador das características da flora, rica em madeiras de lei que estavam a cada ano tendo um crescimento na exploração. Muitos eram aqueles que, impulsionados pelo desmatamento, queriam tirar proveito econômico dos cortes de madeiras de leis que existiam em abundância nestas terras.

Álvaro também era cliente daquilo que após a abertura de clarões seria possível produzir. As primeiras plantações de café verificadas próximas à sua propriedade, bem como, em localidades que usufruíam da fundação do povoado de Lucélia, abria perspectivas para o comprador realizar a derrubada e constituir a lavoura cafeeira.

As terras que estendiam-se um pouco além do povoado da União que abrigava médicos proprietários, tinham um traçado em sentido leste e pertenciam ao Coronel Elisário Ramos. Famoso latifundiário da época e detentor de posse que abrangia uma extensa faixa, a referida propriedade datava do início do século, porém, pouco de efetivo nos primeiros anos da década de 40 havia sido feito em sua delimitação. Por possuir influências que o habilitou a manter suas posses mediante uma certa vigilância, um processo de vendas de glebas que estavam nas mesmas condições que a de Elisário começou a ser efetuado, culminando com a repartição destes filiões em fazendas que mesclavam suas posses com a compra e a conquista.

Ao comprar as terras do Coronel, Álvaro não imaginava que um ciclo de exploração de madeira iria crescer nas proximidades de suas recentes posses. As pressões provenientes de inúmeros colonizadores interessados em montar serrarias acabou abalando a posse inicial de Junqueira que, paulatinamente, viu sua extensão ser contornada por exploradores da madeira e clarões que retornavam à sua cor verde com a inserção da lavoura cafeeira.

Já em 1944, mais precisamente no dia 1° de novembro, após alguns estudos, resolveu entregar a administração de parte de suas terras para os corretores Eugênio de Lucas e Salvador Laós. A idéia era realizar e vende de lotes num espaço que pretendiam urbanizar para servir de referencial às propriedades rurais que estavam sendo abertas no centro do Espigão Peixe-Aguapeí. No projeto de loteamento, constava claramente um nome: Junqueirópolis. Oficialmente em 1° de novembro de 1944 foi fundado o "Patrimônio de Junqueira", nome relacionado diretamente com o dono das terras que pretendia vender pequenos lotes a bom preço, que pudesse satisfazer tanto o vendedor como os compradores. Objetivava, dessa forma, a aquisição de um capital proveniente de sua grande extensão de terras que, obviamente, não iria se desvanecer, mas sim, ser valorizada.

Em questão de meses de reconhecimento, no intuito de trazer o conforto espiritual para todos aqueles que aproximavam-se de suas extensões, bem como, especulavam em torno do projeto de urbanização na tentativa de encontrarem uma economia em expansão para conquistarem melhores condições de vida diante da abertura de um clarão, o dono das terras assessorado por inúmeros colonizadores, resolveu erguer uma "cruz de madeira" feita pelo senhor Possato com a matéria-prima retirada das matas.

Na realidade, ao encontrar o "cruzeiro" numa clareira que acabara de ser aberta na floresta, aqueles que participaram buscavam inserir diante do cotidiano inóspito do desbravamento aquilo que eles imaginavam ser uma "fé inquebrantável". Com algumas dezenas de pessoas que seguiam o credo católico, tendo ao centro o dono efetivo das terras, aquele momento ficou caracterizado como um dos mais importantes daqueles anos de desbravamento. Tratava-se do dia 13 de junho de 1945. Em homenagem ao Santo Antônio de Pádua, o símbolo da fé católica foi introduzido no cotidiano dos que chegaram na região ou estavam por estabelecerem-se levando os valores de suas terras natais.

Diante deste ato simples, mas de grande significado religioso, uma tradição passou a ser relevada na vida daqueles que estavam trabalhando sob a chefia de Álvaro. A "cruz" e o "machado" caracterizavam um grupo de colonizadores ambiciosos por conquistar melhores condições de vida com o "trabalho" e sedentos por uma proteção no seu dia-a-dia que apenas poderia ser sanada com a introdução da "religião". Nascia, dessa forma, paralelamente nas terras de Junqueira, uma definição clara de que era o desmatamento, seja no sentido imaginário ou econômico.


Horácio Cajado de Oliveira, um dos fundadores


Por mais que se queira entender as intenções deste ato realizado no dia 13 de junho de 1945, não passava pela consciência daqueles que ali estavam a ampliação significativa dos clarões seguida por um surto de povoamento. Para Álvaro, "dificilmente seria prevista pelos poucos espectadores daquela solenidade, o início de uma povoação com ascensão formidável".

Tendo ciência de suas obrigações, restritas à uma melhora de vida diante das riquezas que havia presenciado na sua propriedade, Junqueira deparou-se, em menos de um ano após o ato religioso de 13 de junho, com a chegada de inúmeros colonizadores interessados em conseguirem trabalhos diante do processo de desbravamento. A fundação do Patrimônio, pelo menos oficialmente, abria perspectivas de um desenvolvimento mais expressivo e Álvaro, ao estudar a ampliação de seu projeto, idealizou juntamente com Sunao Oye e Torataro Takitami metas necessárias para o Patrimônio alcançar mediante a aproximação de mais uma Lei Qüinqüenal, da elevação do mesmo à condição de município.

Alvaro de Oliveira Junqueira, Horácio Cajado de Oliveira, Henrique Coutinho, Sunao Oye, Torataro Takitami, José Amatruda foram exemplos de residentes que abriram o processo de elevação do Patrimônio.


Residência de Horácio Cajado, cunhado de Álvaro Junqueira, que foi um dos primeiros moradores


Desde a participação direta do escritório e das relações mantidas por Junqueira, junto à autoridades estaduais e federais, até a contribuição de membros da colônia Japonesa que se instalava na localidade com uma força considerável, o movimento pró-emancipação passou a ser cogitado à partir do ano de 1945, quando abria-se as perspectivas de uma nova Lei Qüinqüenal que pudesse elevar vários povoados existentes no grande município de Lucélia à categoria de Distritos de Paz ou de município.


De chapéu Branco, José Amatruda, um dos fundadores


Os motivos que norteavam esta ambiciosa idéia estavam na própria realidade verificada pelo dono das terras em que estava inserido o Patrimônio. Álvaro estava consciente de que, se acaso, os trabalhos de vendas de lotes prosseguissem na mesma toada, seria possível em matéria de dois anos pleitear diretamente a elevação da localidade à município.

Para isso, usou de algumas estratégias que imiscuíram-se. A intensificação nas propagandas do loteamento que mostrava-se próspero, unindo-se às relações mantidas pela empreendedora junto à autoridades estaduais, formou um ambiente que demonstrava grandes probabilidades de uma avanço significativo perante a Lei Qüinqüenal que se aproximava.

Os trabalhos promovidos pela Empresa de Urbanização de Junqueira possibilitaram um crescimento nas vendas, bem como, a chegada de um número expressivo de pessoas interessadas pelos benefícios que o desenvolvimento local proporcionava. Isto foi sentido com o progresso do Patrimônio. Inúmeras construções estavam consumando-se diante das primeiras ruas que a empresa abrira para promover a urbanização.


Residência de José de Amatruda, um dos fundadores do município


As edificações que se iniciavam exigiam mão-de-obra de inúmeras procedências. Uma gama de trabalhadores ou influentes estavam constituindo morada em propriedades rurais situadas nas cercanias ou em lotes que tinha suas vendas promovidas pela Empresa de loteamento. Desde trabalhos intelectuais sofisticados para a época até ações que envolviam o suor de pessoas consideradas humildes, porém, trabalhadoras e imbuídas de um espírito de progresso próprio daquele momento histórico, constituiu o crescimento que seria necessário para os empreendedores concretizarem a idéia ambiciosa de elevação do Patrimônio à município.

Mais precisamente em novembro de 1946, portando, dois anos após a oficialização do Patrimônio, Horácio deixou a gerência dos negócios imobiliários a cargo do senhor Henrique Coutinho, que dentre outras propostas de progresso do vilarejo possuía a mais atraente: a promoção do Patrimônio de Junqueira à município.

Com a chegada de Henrique Coutinho, as discussões com relação ao fato intensificaram-se. Era corrente perante os mais influentes no empreendimento a necessidade da formação de uma Comissão Pró-Emancipação, que tinha como objetivo direcionar os trabalhos burocráticos que adviria deste processo.

Mediante alguns contatos esporádicos de interessados no projeto, vários reuniões nos idos de 1947 foram realizadas no Escritório Imobiliário para tratar da formação e das ações da Comissão Pró-Emancipação. Diante da organização, chegou-se a conclusão que o trabalho de elevação deveria ser dividido.

De um lado era necessário realizar uma conscientização local da população instalada no Patrimônio e nas cercanias. A preocupação neste sentido, estava num esclarecimento perante a sociedade com relação a uma eventual convocação de Plebiscito realizada pela Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo que poderia ocorrer após aprovação da reivindicação de elevação. Para isso, um trabalho de pedido de votos favoráveis à mudança da condição administrativa do Patrimônio Junqueira começou a ser realizado pelo Gerente do Escritório Henrique Coutinho. A organização deste trabalho de conscientização foi rápida e, de imediato, partindo de diretrizes e notícias vindas do escritório, muitos residentes em Junqueira foram sensibilizados formando um clima favorável para a convocação de um eventual Plebiscito.


Antigos moradores, de chapéu branco, Álvaro Junqueira, fundador


Num outro plano encontrava-se, com sua influência, Álvaro de Oliveira Junqueira. Sua tarefa estava em manter contato com instâncias estaduais para saber do momento propício de encaminhamento à Assembléia do pedido de elevação. Mas, além desta sintonia, era necessário conquistar Deputados Estaduais para efetivar trabalhos que pudessem agilizar e promover o pedido. Isto não foi difícil tendo em vista que existia um interesse grande de deputados em pleitearem processos deste tipo, tendo em vista as possibilidades de crescimento político que os cercavam.

Constituía-se desta forma uma estrutura favorável à elevação do patrimônio de Junqueira à Distrito de Paz, organizada desde a panfletagem perante a sociedade até a composição de grupos de Deputados Estaduais na capital.

Há quem diga que essa estrutura em favor da elevação foi tão grande que de imediato, aquilo que parecia ser um movimento de elevação a Distrito de Paz, ganhou vulto e a cogitação para a emancipação administrativa de Junqueira foi crescendo. A comunicação entre as instâncias mais superiores de análise do pedido com a sociedade era garantida justamente pelo trabalho massivo que o Escritório realizava perante a população. Dessa forma, um clima de euforia envolveu as poucas ruas abertas do Patrimônio com o propósito de pleitear uma elevação mais significativa: a circunscrição de município. Os contatos de Álvaro com autoridades estaduais era encorpado até mesmo com proprietários agrícolas das cercanias do vilarejo, o que possibilitava boas perspectivas com relação à dupla elevação de Junqueira.

No final de 1947, os trabalhos estavam adiantados ao ponto da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo decidir pela abertura de Plebiscito para elevação do Patrimônio de Junqueira à Distrito de Paz e Município simultaneamente. Diante desta decisão, algumas preocupações rondaram a vida daqueles que participavam diretamente do movimento. O que mais incomodava era, justamente, a denominação "Patrimônio de Junqueira", que segundo a ótica de muitos participantes do Movimento Pró-Emancipação, soava como algo muito pessoal, dando a figura de Álvaro a personalidade de grande herói de tudo que até então acontecera. Para muitos que participaram deste processo de construção do vilarejo, acaso a confirmação da elevação fosse consolidada seria necessário discutir o nome do futuro município, pois o Patrimônio de Junqueira tinha sido originado a partir da idéia de que suas ruas estavam sendo abertas nas terras de Álvaro, mas que naquele momento, já não era totalmente dele. Por outro lado existiam aqueles inseridos no Movimento que defendiam o triunfalismo de Álvaro, pois este era considerado o grande empreendedor que colocara seu esforço em torno do empreendimento antes de todos, arriscando uma compra e organizando uma planta urbana com seus próprios recursos. Para estes, era importante a manutenção do nome.


Primeira casa de alvenaria de Junqueirópolis, que era de Álvaro Junqueira


Diante das discussões que norteavam a denominação de "Patrimônio Junqueira", a unanimidade com relação a exclusão de Patrimônio era a tônica, tendo em vista que as condições de circunscrição não seriam mais as mesmas. O que incomodava era a formação de um município cujo nome iria ser simplesmente Junqueira. Foi justamente diante desta problemática que muitos começaram a chamar o vilarejo pelo nome de "Junqueirópolis", significando a união do sobrenome daquele que idealizou a urbanização destas terras – "Junqueira" –, juntamente com o conceito grego e, portanto, já tradicional na época, que norteava uma organização administrativa municipal: "Polis". Dessa forma, no final de 1947, o Patrimônio de Junqueira passou a ser chamado de Junqueirópolis.

Apesar de, para muitos, a transformação de nome ser vista como uma imposição daqueles que trabalhavam no Escritório do patrimônio, a designação foi bem aceita pela população, pois significava para muitos uma vitória diante do que o desenvolvimento da localidade exigia. O termo adotado, para muitos, era entendido como adequado ao progresso verificado na época e, portanto, estava inserido diante de uma ideologia de desenvolvimento nascente diante da política de crescimento nacional.

Começando a falar o novo nome do seu Patrimônio com intensidade, a população de Junqueirópolis, bem como os dirigentes do empreendimento urbanístico, passaram a esperar o Plebiscito, confiando que nenhum resultado negativo iria ser consumado, tendo em vista o clima de euforia que circundava todos aqueles que tinham direito à voto. Com a realização da votação, ficou confirmado as ambições da sociedade. Pelo menos diante da vontade popular, Junqueirópolis deveria ser elevado à município. O resultado do Plebiscito comprovou.


Comício de um deputado para consolidar tal promoção


Restava a palavra final da Assembléia Legislativa que, para os envolvidos no assunto, deveria ser divulgada até o final do ano. Justamente em 24 de dezembro de 1948, mediante a Lei n° 233, Junqueirópolis tornou-se município em meio à uma ostentação poucas vezes sentidas por diferentes povoados. Diante de seu tamanho crescimento e de uma organização que lutou pela emancipação poucas vezes vistas em localidades da região que se formava, o Patrimônio conquistou uma dupla elevação, saindo da mera condição de vilarejo para a pomposa condição de município que tanto era requerida por variados povoados em formação na época.

Origem do nome

Na colonização do oeste paulista durante o século XX, muitas cidades nasceram de pequenos arraiais, estabelecidos como ponto de pouso nas propriedades agrícolas por onde passavam as caravanas de colonos, que buscavam as lavouras de café e algodão do Interior. Foi o que ocorreu com Junqueirópolis, que se originou de um pequeno ponto comercial, estabelecido nas terras que Álvaro de Oliveira Junqueira havia adquirido, na década de 40, entre um monte, divisor dos rios do Peixe e Feio, no município de Lucélia. O povoado se firmaria, então, em torno da venda, com o loteamento que Álvaro Junqueira promoveu para os que quisessem morar em suas terras. A fundação oficial do vilarejo se deu a 13 de junho de 1945 e o nome que recebeu, Junqueirópolis, significa, literalmente, cidade (do grego, pólis) do Junqueira, isto é, uma homenagem explícita ao proprietário das terras e, por isso, considerado o fundador do município. Adjetivo pátrio – Junqueiropolense. Denominação promocional – "Cidade Verde".

Data de emancipação – 24/12/1948.